Lembro como se fosse ontem, ela ali sentada naquele banco com o mesmo vestido, o mesmo corte de cabelo e esperando pelo mesmo bonde. Eu me aproximei, sentei ao seu lado e sorri, ela retribuiu timidamente, desviando o olhar para o lado.
A multidão passando ao nosso redor ignorava tamanha beleza, não percebiam aquele rosto angelical, pessoas de todos os lados esperando suas conduções e ela lendo um livro de poemas um pouco mais pesado dos que são recomendados para moças.
Passei alguns minutos considerando sobre o que falar e comentei sobre o livro, afinal Álvares de Azevedo não era um livro que qualquer jovem leria, foi a coisa certa a fazer, o assunto a motivou e conversamos até que seu bonde chegasse.
No decorrer dos dias, conversamos mais e, após um mês, tomei coragem e a pedi em cortejo. Ela timidamente aceitou, passei, então, a frequentar sua sala de estar, levava flores e poesias e, com a graça de Deus, também fui aceito por sua família.
Amei por todos os minutos em que passamos juntos e consegui amar muito mais depois que me deixou. Doeu-me imensamente o dia em ela partiu com Jaime, um filho de comerciante, que melhor que eu tinha apenas os bolsos.
Esperei seu regresso por mais de dez anos e não foi em vão, vendo-a ali parada à porta, mais linda do que nunca, meu coração me lembrou do que o motivou a escolhê-la.
Ela recebia a todos sorrindo, como uma anfitriã deveria fazer, mas eu sabia que não estava feliz, via através de seus olhos o quanto sofria e por alguns minutos apreciei isso. Ela decidiu sofrer, eu daria a ela toda a felicidade do mundo, mas ela preferiu dinheiro.
Quando o jantar acabou, e todos se foram, esperei por mais um tempo até finalmente poder estar a sós com ela; então, a puxei pelo braço, enlacei sua cintura e acariciei sua face, seu corpo ardia em chamas, seus olhos envenenavam os meus, desci minha mão por seus seios e cravei uma faca em seu peito, como ela havia cravado no meu.