Juremir Machado

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A Ditadura Militar, muitas vezes, responsabilizou e justificou o Golpe através das atitudes políticas adotadas pelo Jango, como, por exemplo, as reformas de base. E a esquerda responsabilizou Jango por não ter resistido. Afinal, qual é o papel de Jango nisso tudo?

Jango andou, como se diz, sempre no fio da navalha, pressionado pela direita e pela esquerda. Para a direita, ele era o representante de uma radicalização comunista crescente. Para a esquerda, ele não acelerava suficientemente as reformas. A partir de março de 1964, especialmente com o Comício da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, em 13 de março, Jango definiu o que pretendia para o restante do seu governo. As reformas de base foram assumidas e formalizadas na mensagem ao Congresso Nacional enviada no dia 15 de março. O golpe, que já vinha sendo articulado desde 1962, ganhou os detonadores de que necessitava. A mídia ajudou a criar o clima necessário à deposição do presidente. Dado o golpe, Jango não resistiu. Sabia que não havia condições militares de ser bem-sucedido. O general Amaury Kruel, seu compadre, comandante do poderoso II Exército, baseado em São Paulo, traiu: passou, na última hora, para o campo golpista. O IV Exército, em Recife, estava atolado na conspiração. O III Exército, em Porto Alegre, tinha um novo comandante, nomeado por Jango, general Ladário Telles, recém-chegado ao Rio Grande do Sul, sem controle efetivo da tropa. Além disso, Jango estava informado de que os Estados Unidos deslocariam uma força naval para a costa brasileira. Resistir seria provocar uma guerra civil sangrenta e inútil. Jango teve a coragem de frustrar esse desejo da esquerda. Não vingaria.

Às vésperas do Golpe Militar, o Brasil vivia um momento de grande efervescência política, com manifestações muito grandes nas ruas. No ano de 2013, as ruas novamente foram tomadas por manifestantes, a maioria jovens. É possível estabelecer alguma comparação entre momentos aparentemente tão distintos?

O paralelo mais evidente diz respeito ao papel da mídia e à estratégia da direita: tanto em 1964 como em 2013, a mídia e a oposição atacaram o governo como sendo o mais corrupto de todos os tempos. O mesmo aconteceu em 1954, o que levou Getúlio Vargas ao suicídio. A ideia subjacente é que esquerda no poder significa corrupção. Como em 1964, em 2013 também direita e esquerda se encontraram na rua insatisfeitas com um governo de centro-esquerda. As manifestações de 2013, porém, parecem ter pedido mais democracia, não menos. Em 1964, as Marchas da Família com Deus pela Liberdade, patrocinadas pelos Estados Unidos, queriam o golpe contra o presidente João Goulart. Foram vitoriosas.

As redes sociais têm contribuído para a disseminação da informação. Diferente do que ocorre nos meios oficiais de comunicação, tais como jornais, revistas e TV. Na sua opinião, as redes sociais são canais para o fortalecimento da democracia?

As redes sociais são um contrapoder fundamental. Permitem a cada pessoa expressar-se. Antes delas, o poder da emissão estava concentrado em poucas mãos e mentes. O problema das redes sociais é que servem para o bem e para o mal. Possibilitam desmontar mentiras, mas também servem para caluniar, difamar e destruir injustamente reputações. São um espaço de guerra política. Feitas as contas, são muito mais positivas do que negativas. Representam o fim de uma época, o do controle absoluto da opinião pela mídia.

A democracia atual sofre duros ataques de indivíduos que defendem a volta da ditadura. A corrupção e a falta de segurança têm sido os principais motes. O que você pensa sobre isso?

Há um visível desconforto da direita brasileira com as políticas sociais dos governos do PT. Por trás das críticas, pertinentes ou não, à corrupção está o ódio ao bolsa-família, ao ProUni, às cotas e à intervenção do Estado em assuntos que os liberais gostariam de deixar livres para o mercado soberano. Vivemos uma guerra simbólica, política e ideológica. Diante dos avanços existentes, com contradições e fragilidades, só resta aos adversários do governo, explorar e ampliar o ponto fraco da situação: a corrupção, que é grave, mas dificilmente em níveis acima da média histórica brasileira. Acontece que o PT se consagrou como partido da ética. Isso nunca lhe será perdoado. Essa contradição entre discurso e prática é um fantasma que assombrará o PT por muito anos. Em parte, isso é resultado do sistema eleitoral e político brasileiro, com financiamento privado de campanha e um presidencialismo de coalização, que obriga a fazer alianças pré e pós-eleitorais para governar. Outra parte dos deslizes talvez venha do imaginário segundo o qual tudo é válido na luta contra a burguesia e contra o capitalismo. Com mais transparência, tudo isso ficará para trás.

 

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