Neste ano de 2019, durante o primeiro trimestre, na disciplina de Filosofia, os alunos das 2ª séries da Fundação Liberato foram introduzidos à cultura filosófica helênica. Tiveram o contato com diferentes correntes filosóficas, tais como, o Epicurismo, o Estoicismo, o Pirronismo e o Cinismo. Organizados em pequenos grupos, os alunos foram desafiados a realizar um estudo sobre uma dessas correntes filosóficas, identificar uma tese, desenvolver um Ensaio Filosófico e apresentar aos colegas de turma. O Ensaio filosófico consiste num texto argumentativo que parte de uma pergunta e segue com etapas bem definidas. A resposta se inicia com uma tomada de decisão sobre a pergunta. Segue com as possíveis objeções que poderiam refutar a tese defendida e após argumenta-se contrariamente às objeções, identificando os seus limites, reforçando com isso, a própria tese. Ao final, retomam-se os elementos mais relevantes da argumentação. Essa atividade permite ao aluno adquirir conhecimentos da cultura filosófica e favorece a construção de um pensamento autônomo.
Leandro Andrighetti
Professor de Filosofia
Fundação Liberato
O assombro da morte pode nos
impedir de aproveitar a vida?
Gabriela Welter
José Pedro Costa Curta
Milena Bernardes Pereira
Pedro Gehlen Selistre
Alunos do Curso Técnico de Química
Fundação Liberato
1. Problema
A preocupação com a morte é uma das questões existenciais que atravessam séculos. Por volta dos séculos III e II a.C, as pessoas viviam mentalmente perturbadas, sem paz de espírito, sendo as preocupações com a morte uma das principais causas geradoras da infelicidade. Surgiram diversas correntes filosóficas que tentavam servir de referência para as pessoas lidarem melhor com os problemas existenciais. Dentre essas, destaca-se o Estoicismo. A partir do conhecimento sobre essa corrente filosófica, formulamos a seguinte questão: o assombro da morte pode nos impedir de aproveitar a vida?
2. OBJETIVO
O presente ensaio filosófico tem como objetivo explicar, de acordo com o Estoicismo, como devemos lidar com as adversidades da vida, levando em conta o que podemos ou não controlar, resultando, assim, num estado de felicidade plena e, ao mesmo tempo, não desperdiçar nossas vidas preocupados com a ideia da morte.
3. IMPORTÂNCIA DO Problema
É difícil imaginar alguém que aproveite bem a vida e ao mesmo tempo esteja preocupado com a morte. Para o Estoicismo, é um erro querer “fazer nossas as coisas escravas por natureza”, isto é, querer controlar as coisas que não dependem de nós. Somente quando soubermos distinguir as coisas que estão ou não sob o nosso controle é que poderemos tirar o melhor proveito da vida.
4. Tese concorrente
A principal tese concorrente é o Epicurismo. O Epicurismo defende que a satisfação dos prazeres é que proporciona o sentimento de felicidade. No entanto, há dores até preferíveis quando delas resultarem prazeres mais duradouros. A prudência na escolha entre prazeres duradouros e imediatos é o que possibilita a ataraxia, isto é, a imperturbabilidade da alma, o que tornaria a vida feliz.
5. Tese
Para aproveitarmos a vida e o tempo que nos é dado, buscamos a felicidade, todos nós sonhamos em chegar ao dia em que finalmente seremos felizes. Para isso, o Estoicismo leva em conta os seguintes princípios:
a) Tudo tem um porquê: Os gregos acreditavam numa lei universal que era responsável por ordenar todas as coisas que existem, uma força organizadora, a lógica racional por trás de tudo, que eles chamaram de logos. O que nos leva para o segundo princípio.
b) Para viver feliz, é preciso estar alinhado com o logos, viver de acordo com sua natureza, com tudo que faz o ser humano ser o que é: desenvolver suas habilidades, dons, inteligência, capacidade de pensar e filtrar nossos instintos. Já a infelicidade, de acordo com o pensamento estoico, reside em tudo aquilo que foge da nossa natureza, que não é natural ao homem. Viver sem inteligência, sem usar da razão, sem virtude, sem valores, com isolamento social.
c) Cabe ao homem preocupar-se apenas com o que depende dele. Tudo na nossa vida pode ser dividido em dois grupos: coisas que podemos controlar e coisas que não podemos. Aquilo que o homem não pode controlar, que não depende dele, deve apenas ser aceito. E devemos exercitar essa nossa capacidade de dominar o que podemos controlar, como nossas emoções; neste aspecto, divergindo do Epicurismo, que acredita que as emoções resultariam no sentimento de felicidade.
6. Argumentos a favor da tese
A morte e a doença são assuntos recorrentes na filosofia estoica. O estoico sabe que não pode controlar se vai ficar doente ou não, ele não tem poder de controlar a doença, mas tem o poder de fazer escolhas saudáveis. As coisas que merecem suas preocupações são aquelas que estão sob seu poder
O estoico não tem medo da morte e aceita com serenidade o fato, uma vez que não está sob o seu controle. Conforme Epicteto: “A única coisa horrível sobre a morte é o julgamento dos homens de que ela é horrível”.
Se observarmos a realidade contemporânea, marcada por inúmeras preocupações, os ensinamentos estoicos também podem ser considerados em nosso dia a dia. Supondo que seja construído um aeroporto perto de sua casa, criando barulho constante, o jeito de lidar com este problema poderia ser ficar reclamando do barulho ou pensar como os estoicos, que, avaliando estar fora do seu controle, evitariam tomar isso como problema deles.
7. Possíveis Objeções
O estoico é alguém que foge à realidade com mentiras, a fim de sentir-se feliz em circunstâncias que seriam de outro modo vistas como desagradáveis. É um exemplo daquilo que Nietzsche chamava de “moral de escravos”, essencialmente baseada em impotência e em uma inabilidade de olhar de frente algumas verdades duras a respeito da vida e apenas aceitá-las.
Há uma passagem célebre de Epicteto na qual ele diz que toda noite, antes de dormir, quando beijamos nossos filhos ou aqueles que amamos, deveríamos nos lembrar de que eles são somente mortais. Críticos do Estoicismo acusaram tais trechos de serem exemplos da frieza e da insensibilidade dos estoicos.
8. Contraobjeções
Porém é o extremo oposto do que efetivamente encontramos em autores estoicos, tais como Epicteto e Marco Aurélio. Ao invés de tentar fugir com mentiras a olhar de frente a realidade, um tema central da obra desses dois estoicos romanos é forçar-nos a confrontar algumas verdades duras e, muitas vezes, desconfortáveis que dizem respeito ao funcionamento do mundo. Como a morte, exemplificada na passagem de Epicteto.
9. Conclusão
A principal questão na vida de qualquer ser humano é saber como e quando irá morrer. Ficamos refletindo se iremos ter uma vida bem-sucedida, uma família feliz e uma vida tranquila para podermos descansar ao final dela. Ou seja, passamos a vida toda nos preocupando não só com o hoje, mas, sim, com tudo que vem depois. O Estoicismo diz que há certas coisas sobre as quais temos controle e outras que não temos, e ainda ressalta que as coisas que controlamos devem ser nossa única preocupação, enquanto aceitamos e desapegamos do resto. Quando se entende isso e se aprende a lidar com as adversidades, entendemos o conceito de resiliência, uma das características dos estoicos.
A morte é algo sobre a qual não temos controle e nem sabemos como nos preparar para ela, nem sabemos o que nos espera e já temos um medo absurdo. Ao longo dos séculos, as pessoas foram formulando maneiras de deixar essa questão menos preocupante, tendo uma vida mais saudável para ter uma expectativa de vida maior, a exemplo dos remédios que foram inventados para proporcionar longevidade. Mas, mesmo com todas essas inovações, essa preocupação com a morte sempre vai ser algo pertinente nos seres humanos, pois é algo inevitável e desconhecido, e isso causa angústia nas pessoas. Por isso, na visão dos estoicos, a única maneira de não nos preocuparmos é termos a consciência de que, tudo que não está sob o nosso controle temos que aceitar, pois não pode ser mudado. O que podemos mudar é o modo como lidamos com ela.
Devemos nos preocupar com a morte?
Amanda Paola klaffke
Ana Manoela da Rocha
Arthur Mota Leie
Maria Eduarda Prado Viegas
Alunos do Curso Técnico de Química
Para Epicuro, o sentido da vida é o prazer, prazer este que fundamenta o conceito de felicidade, como a satisfação dos desejos, já que, para ele, tudo que existe é matéria, mesmo nossas almas, a felicidade e, por consequência, as sensações, ser feliz é sentir prazer. Assim, a filosofia funciona como um instrumento prático, cujo papel é assegurar a imperturbabilidade da alma (ataraxia), a ausência da dor corporal (aponia) e a libertação dos homens de seus medos.
Objetivo
Nosso objetivo com este ensaio filosófico, é, precisamente, defender que não devemos nos preocupar com a morte, pois o medo desta, como Epicuro apresenta em “Carta a Meneceu”, é um grande fator de angústia que leva à infelicidade.
Importância
A importância do nosso problema está relacionada com as frustrações que adquirimos ao nos preocupar demasiadamente com a morte. Dar extrema importância às nossas preocupações, todas aquelas que geram desprazer, e nos impossibilitam de atingir a ataraxia, relaciona-se diretamente o com um desprazer que, em algum momento de nossas vidas, acaba por nos afetar. O medo de morrer, ou em alguns casos mais delicados, achar na morte a solução para determinados problemas, irá nos privar de muitos prazeres.
Tese
Não devemos nos preocupar com a morte, porque pensamentos sobre ela podem ser o estopim para a ansiedade e o medo, desprazeres desnecessários em nossas vidas. Apoiamos a tese de que não devemos nos preocupar com a morte, pois isso é algo que, de qualquer maneira, irá acontecer, independentemente de nossa vontade e ações.
Defesa da tese
Como afirma a psicóloga Pelin Kesebir, um dos ramos da Filosofia, o existencialismo, que estuda como a busca pelo significado de nossa existência afeta o comportamento humano, acredita que a base para a maioria dos problemas psicológicos mais comuns pode ser encontrada na ansiedade das pessoas em relação à morte. Ela acrescenta que, “na verdade, as pessoas, normalmente, não têm medo da morte em si, mas de não terem vivido uma vida de forma adequada”. Outra ideia é trazida pelo romancista William Shakespeare: “os covardes morrem várias vezes antes da sua morte, mas o homem corajoso experimenta a morte apenas uma vez.” Neste ensaio, não se trata de covardia e coragem, porém, se buscarmos um significado etimológico, entenderemos que coragem (do latim coraticum) é a capacidade de agirmos apesar dos medos, ou seja, aqueles que vivem o seu tempo, tidos como corajosos, enfrentam seus medos e acabam tendo menos desprazeres.
Possíveis objeções
A preocupação com a morte é algo comumente visto como relevante a algumas religiões, a exemplo do Espiritismo e do Cristianismo. Para elas, a morte não é vista como fim, mas, sim, como início de um novo ciclo, pois acredita-se que o espírito é imortal, ou seja, apenas o corpo, que seria a matéria, morrerá.
Há, ainda, o questionamento de como não se preocupar com a morte se nossas vidas estão repletas de perigos diários, como assaltos, acidentes de carro, ou até mesmo um simples tropeço que nos levaria à morte. Estamos cercados de inúmeras possibilidades de acontecimentos que, ignorando-se a cautela com eles, podem acabar acarretando a morte.
Contraobjeções
Para Epicuro, somos apenas uma matéria que cumpre um único ciclo, ou seja, a morte significa o fim de nossa existência. Esse fundamento anula qualquer possibilidade que se acredita nas religiões, de que existe mais de uma vida e que nossos atos no presente terão grande influência para o que virá depois. Portanto, se não há nada após a morte, não há necessidade de nos preocuparmos em vão, pois em vez disso, devemos desfrutar as coisas únicas que a vida tem a nos oferecer.
Antecipar-se com medo e angústia com relação à morte apenas vai tirar as oportunidades de ter momentos prazerosos, pois o que não é um peso quando está presente é doloroso quando é antecipado. Consequentemente, a morte não nos diz respeito, pois “quando existimos, a morte não está presente e quando a morte está, já não existimos”. Não há sentido em ocupar-se com algo que só estará presente quando não estivermos mais.
Conclusão
Ao fim deste trabalho, podemos concluir que a corrente filosófica epicurista tem como objetivo nos mostrar a importância da vida e ressaltar, por assim dizer, a irrelevância da morte, pois somos todos constituídos de uma matéria finita, e por isso, não há necessidade de nos preocuparmos com algo que não podemos controlar. Devemos, então, desfrutar o nosso curto tempo de existência, pois somente a vida nos trará prazeres e eles devem ser aproveitados ao máximo. Portanto, a vida é que carrega o significado fundamental de toda existência, e a morte é apenas o fim.