Entrevista com Aldo Rebelo
Deise Gabriela Bays, Hildete Flores Rodrigues, Juliano Francesco Antoniolli,
Raquel Vieira Sebastiani e Vilson Schutz
Professores da Fundação Liberato e integrantes da Comissão Organizadora do Evento
O Seminário da Área de Ciências Humanas de 2022, realizado de forma virtual na plataforma Google Meet, com transmissão pelo YouTube, teve como tema “Brasil: 200 anos de independência”. Discutindo temas relevantes sobre nosso país, as palestras proporcionaram aos participantes a reflexão sobre aspectos da nossa história, trajetória e rumos futuros.
O primeiro encontro teve a palestra do ex-ministro Aldo Rebelo, com o tema “Brasil: projeto de nação ontem e hoje”. Abordou aspectos da história do Brasil e da formação da unidade territorial, desde a independência até os dias atuais, e a defesa de um projeto de retomada da construção nacional.
Abaixo reproduzimos duas perguntas respondidas por e-mail pelo ex-ministro, a partir dos questionamentos realizados no evento:
Na palestra “Brasil: projeto de nação ontem e hoje”, o senhor falou em quatro grandes movimentos da construção do Brasil: a formação da base física, o processo de independência, a consolidação do território e a unidade nacional e a Proclamação da República, chegando aos dias atuais. Pensando no futuro do nosso país, o senhor poderia comentar sobre o quinto movimento, tema do seu livro lançado em 2021?
Aldo Rebello: O Quinto Movimento ou a retomada da construção inacabada do Brasil é a reunião das iniciativas capazes de reorientar o projeto civilizatório brasileiro no caminho do seu destino. O Quinto Movimento exige em primeiro lugar a retomada do desenvolvimento do país, sem o que não há possibilidade de solução para nenhum dos seus enormes desafios. Mas a retomada do desenvolvimento pressupõe a reindustrialização do Brasil e a interrupção do processo de desindustrialização por perda de competitividade e fragilidade da base tecnológica de nossa indústria. O Brasil deve lançar mão da grande potencialidade da sua agricultura, pecuária e agroindústria e da promissora fronteira mineral principalmente na Amazônia. O Brasil precisa retomar o esforço de promoção da unidade e coesão nacionais e de combate ao identitarismo, agenda das corporações para fragmentar e dividir a população. A agenda democrática de luta contra o racismo e de valorização e promoção das mulheres é parte da centralidade da questão nacional e não a negação dessa centralidade como pregam os agentes dos interesses internacionais e de suas corporações financeiras. As principais consultorias que trabalham com as projeções futuras da economia internacional apontam para as próximas décadas que os países economicamente mais fortes do mundo serão pela ordem China, Índia, Estados Unidos, Indonésia e em quinto lugar o Brasil. É uma visão bastante otimista do nosso futuro, e o Brasil precisa se preparar para ele com uma agenda que valorize a educação, usufruto responsável dos nossos recursos naturais, protegendo as florestas e o meio ambiente, mas considerando que dispomos de 30% da biodiversidade do planeta apenas na Amazônia.
Falta reconhecimento da importância dos 200 anos da independência do Brasil pela população em geral, que não demonstra interesse nem conhecimento por toda luta e esforço que ocorreram no passado. Na sua visão, como seria possível mudarmos essa postura e valorizarmos mais nossa história, cultura e capacidades?
Aldo Rebelo: A dimensão das nossas dificuldades pode ser comprovada na grande ausência dos 200 anos da Independência do Brasil na agenda dos governos, da mídia, da academia e da sociedade. A impressão que tenho é que celebramos mais os 150 anos de nossa Independência do que o bicentenário. Pior, os 200 anos da independência dos Estados Unidos, em 1976, foram mais lembrados pela mídia brasileira do que a nossa própria efeméride. Creio que essa grave omissão se deve ao abandono da centralidade da questão nacional tanto a partir dos centros do pensamento liberal conservador e seu desprezo pela história, quanto ao desprezo da memória nacional por parte dos agrupamentos liberais-progressistas que abraçaram a agenda das identidades biológicas em prejuízo da ideologia do nacionalismo progressista. Há um enorme desafio que convoca as forças sociais patrióticas e a intelectualidade nacionalista para fazer frente ao pensamento apátrida que deixou pelo caminho o interesse nacional, ora como pretexto de que ele seria um obstáculo aos objetivos do mercado, ora com a desculpa de que o nacionalismo é sinônimo de autoritarismo e ameaça às liberdades individuais. Na verdade, na era dos impérios coloniais e das potências que aspiram o poder global, o nacionalismo é democrático, o nacionalismo é libertador, o nacionalismo é a única esperança das nações emergentes em busca de um lugar ao sol no planeta.