C.F.A.

Primeiro lugar categoria Conto no Liberarte 2013

Se Caio estivesse aqui, eu ligaria para ele e pediria para  encontrá-lo. Ele me diria “Ok, baby, nos vemos na cafeteria de sempre”. Quando eu chegasse lá, Caio já estaria me esperando com uma xícara de café preto. Ele sempre me obrigaria a tomar café, mesmo eu detestando. “É bom, baby, café preto, forte assim, acorda a alma”. E com esse argumento, ele sempre conseguiria que eu bebesse ao menos meia xícara.

Se Caio estivesse aqui, ele notaria minhas olheiras profundas e minhas roupas amassadas no momento em que eu me sentasse à mesa. E eu não precisaria explicar nada. Ele seguraria minha mão e a beijaria demoradamente. “Baby, não desperdice sua juventude com isso, lembra-se do que aconteceu a mim?” E a lembrança do que aconteceu a Caio me daria força suficiente para terminar de beber o café e ir para casa trocar de roupa, para encontrá-lo novamente uma hora depois em uma boate qualquer.

Ah, se Caio estivesse nessa boate. Ele me apresentaria um homem interessantíssimo, irmão de um editor famoso para quem havia enviado alguns de seus manuscritos. “Baby, divirta-se”. E eu me divertiria, assim como Caio, que, na metade da noite, seria convidado a se retirar da boate por ter se envolvido em alguma confusão por um homem qualquer. Caio, seu parceiro e eu sairíamos do local logo após eu me despedir do homem interessantíssimo e iríamos, tropeçando, para um bar próximo, onde permaneceríamos conversando e bebendo até o amanhecer.

Se Caio estivesse aqui, ele me levaria para casa ao nascer do sol e, delicadamente, me colocaria para dormir após ter tirado algumas fotos minhas vomitando pela casa, deixando-as, antes de partir, no criado mudo ao lado da cama juntamente com um bilhete. “Espero que tenha se divertido, baby”. Mais tarde, quando eu saísse do quarto, temerosa da bagunça que poderia encontrar no restante da casa, tudo estaria limpo, graças a ele.

Se Caio estivesse aqui, eu iria até sua casa, agradeceria pela noite que tivemos e o convidaria para beber uma xícara de café preto na cafeteria de sempre, como agradecimento pela companhia da noite anterior.

Mas ele não está aqui e infelizmente nada disso aconteceu. Nem poderia. Caio morreu vítima de HIV, quando eu tinha apenas dois anos de idade.

Juliana Dias de Mello Estagiária do Curso de Química, Fundação Liberato

Juliana Dias de Mello
Estagiária do Curso de Química, Fundação Liberato

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