Trabalhar com alunos das primeiras séries na Fundação Liberato é muito mais do que apresentar-lhes os conteúdos iniciais com que terão contato no Ensino Médio. É também apresentar a esse aluno uma nova escola, que exige novos hábitos de estudo, nova rotina, nova postura. É também entrar em contato com diferentes histórias, de diferentes alunos, de diferentes famílias, talvez todas com uma mesma expectativa: o futuro.
No início deste ano letivo, na disciplina de Língua Portuguesa, as professoras das primeiras séries elaboraram propostas de produção textual que levavam o aluno a refletir sobre o ingresso nessa nova etapa de sua vida e a contar suas expectativas e experiências. Após, cada uma delas escolheu um texto de um aluno para, neste relato, registrar um pouco dessas diferentes histórias que caracterizam o jovem ingressante na Fundação.
A professora Liane, do curso de Química, escolheu o texto de Helena Fernandes Ferreira, da turma 1123, intitulado “Encruzilhadas”. Já a professora Maria Emília, do curso de Eletrotécnica, optou pelo texto “Os dois lados de um recomeço”, de Camila Santa Helena Papa, turma 2124. A professora Íris, para representar o curso de Mecânica, trouxe o texto “Liberato em cores”, de Eduardo Finger Fleck, turma 3124. Por fim, a professora Daiana, do curso de Eletrônica, escolheu o texto do aluno Crístian Prezzi da Silva, da turma 4123, intitulado “Se não fosse a vice”.
ENCRUZILHADAS
Helena Fernandes Ferreira – Turma 1123
Já era início de novembro e minha insegurança só aumentava. Tudo parecia ter se acumulado. Como se não bastasse a loucura pré-formatura e o discurso (que estava longe de ficar pronto), eu tentava não enlouquecer com a quantidade de matérias que ainda tinha para revisar. Eu sabia que meus pais não botariam pressão, mas o medo de não passar era angustiante. E, se eu achava que tudo acabaria depois das provas, era porque não sabia que elas seriam a parte mais fácil do que ainda tinha por vir.
Foi na sétima série que optei por fazer um curso técnico. Não que eu soubesse exatamente o que eu queria fazer, mas eu sempre havia me visto terminando o colégio e já trabalhando. Passei o último semestre de 2014 relembrando todos os conteúdos em todas as matérias para que meu plano desse certo. Minha meta era, na verdade, passar no Instituto Federal de Canoas, que era na minha cidade e até bem perto da minha antiga escola. Fazer o Técnico em Informática. E, para me garantir, tentaria ainda no Instituto de Sapucaia do Sul. Só no caso de eu não passar em nenhum dos anteriores, eu iria para a Liberato. Ou pelo menos era isso que eu achava.
Finalmente estava na metade de dezembro. O listão da Liberato já havia saído e meu nome estava lá. E no do Instituto de Canoas também. Logo minha família toda já sabia e começaram os “Parabéns!”. E foi ali também que minha dúvida cresceu. Eu não contava com meia dúzia de primos me parabenizando exclusivamente por ter passado na Liberato. Particularmente, não achei que foi uma pressão, eles haviam estudado lá e queriam me contar de tudo. Aquilo, de certa forma, fez minha velha decisão tomar outro rumo. Era Informática que eu queria? Mas e se eu chegasse no meio do curso de Química e me arrependesse? E se eu tivesse que ir para um colégio comum caso rodasse?
Hoje, minhas perguntas foram quase todas respondidas e só uma parte delas ainda busca por respostas. Deixei de lado meu antigo plano, em que estaria perto de antigos amigos, para embarcar no desconhecido mundo da Química, onde não conhecia ninguém. Não sei explicar como tomei minha decisão, foi tudo tão depressa que não consegui capturar o momento. Talvez em algum ponto entre eu ter finalmente terminado meu discurso de formatura e o listão do Instituto de Sapucaia. Não sei dizer. Alguns medos permanecem, mas houve uma razão para eu estar aqui. Se daqui a alguns anos eu estiver como me imagino, mesmo já sabendo que no processo terei que estudar como nunca e me organizar um pouco melhor, todo o esforço terá valido a pena. Se eu puder sair da Liberato sendo uma referência a outros, então todos os medos sentidos hoje terão sim valido a pena.
OS DOIS LADOS DE UM RECOMEÇO
Camila Santa Helena Papa – Turma 2124
Reencontro
Redescoberta
O preto e branco
O bom e ruim
Os dois lados
As duas dores
Tudo por uma nova paixão
Por um novo sonho
Um novo eu
Correção de percurso
Erros inconsequentes
Descobertas inovadoras
Dedicação revigorante
Tudo superado
Pronto para florescer
Como uma bela flor
Que morre
Mas incansável
Deixou sua última semente
Sem desistir
Para recomeçar
LIBERATO EM CORES
Cinza, tudo cinza, apenas o relógio e uma folha de papel se destacavam no tempo escuro da sala, onde vários ainda se encontravam sentados ao meu lado. Concentrados no que determinaria uma parte de seus futuros e, pior, do meu também.
O silêncio dominava. Até que um som alto interrompeu a quietude. Todos, inclusive eu, nos levantamos e entregamos uma pequena folha, que resumia três horas de trabalho. Em seguida, todos seguiram seus rumos e deixaram a sala.
Agora, depois de alguns meses, volto ao mesmo lugar e noto algo: está tudo colorido, azul, vermelho, verde, amarelo, tudo cheio de cores. Um sentimento de vitória no ar, conquista, e irá continuar assim.
As cores estarão sempre presentes, pois nunca as deixarei sumir. Elas podem desbotar em alguns pontos da minha tela, mas… desaparecer? Nunca! Porque vou continuar a retocá-las para que estes quatro anos aqui sejam os mais cheios de cores e vida pelos quais vou passar…
SE NÃO FOSSE A VICE
Comecei a considerar a ideia de entrar na Fundação Liberato quando fui parar na sala da vice-diretora. Ela me deu uma ocorrência e começou a conversar comigo. Falou por quase uma hora, até chegar ao ponto de começar a me elogiar, dizendo que eu era inteligente, que tinha a capacidade, que deveria mudar e me dedicar mais.
Foi assim que conheci a Liberato. Foi nessa conversa que ela me disse que eu tinha capacidade de entrar lá. “Quê? O que é a Liberato?” Estranhando minha reação, ela me explicou o que era. Depois, me despedi e fui embora.
Chegando em casa, fui pesquisar. No dia seguinte, fui falar com ela, e isso virou uma rotina. Todos os dias, no recreio, ia conversar com ela, desabafar e pedir conselhos; não sabia o que queria ser no futuro.
Depois de uns vinte dias conversando, acabei decidindo me inscrever para a prova, e ela me deu todo apoio. Cheguei em casa e contei aos meus pais, eles ficaram meio surpresos mas também me apoiaram, para minha alegria.
Quando veio a notícia de que havia passado, foi a maior festa, todo mundo dando os parabéns, e você sabe como é…