Sinto-me velho, minhas pernas não aguentam mais tanta caminhada, foram tantos problemas, sofrimentos, desgraças, tragédias em apenas um ano. Quase uma vida, diria eu, o mar não tem mais a mesma cor, os dias não possuem o mesmo brilho, nem ao menos as músicas o mesmo tom. Ahhhh! Quanta desmotivação, esta vida sem ação, viver correndo é complicado mesmo, cai-se na rotina, nas mesmices, nos padrões.
Pelas ruas dessa cidade desacreditada pela poluição, pelo desgaste, eu ando meio cabisbaixo, tudo tão comum mesmo. Chego à rua da pracinha, lagos, peixes, árvores e lindas flores, mas não é a mesma coisa, ahhhh! Como dói, como é fraco o coração!
Mais mortes, mais bebedeiras, mais roubos e choradeiras, que ano cruel! Pedras nas minhas costas, eu carrego tudo mesmo, escravo desse tempo, mas que tempo é esse, que todos correm contra?
Volto à praça, caminho, com passos largos. Ouço o barulho de balanços, mas como se aqui não há crianças? Vou averiguar e vejo um menino, seus cachos esvoaçavam contra o vento do balanço, que visão fora dos paradigmas, vou e sento-me no balanço ao seu lado. Ele me olha preocupado e diz:
– Nossa! O que aconteceu com o senhor? – disse com uma voz angelical.
– Ahhh, meu jovem, é essa falta de harmonia, este mundo inteiro, esta desgraceira. Eu quando era jovem, tinha alguns sentimentos que já não lembro mais, e é tão doloroso este ermo coração. Queria mesmo era voltar a ser criança.
– Vamos brincar no escorregador? – Disse o menino inquieto
– Vamos, mas com uma condição, eu vou primeiro – sentia-me um abobado.
– Quem chegar primeiro que vai, ué – Disse com um sorriso infantil.
Naquele dia, aquele simples menino, me ensinou a ser criança novamente, eu vi as cores, eu vi as aves, as flores, as canções. Eu senti os cheiros, os ares, as almas… E chorei, com um abraço, eu senti novamente meu coração de criança, a esperança, a paz, aquele sentimento voltou, meu inabitado coração, se encheu de pequenas criaturinhas pulantes. Um pequeno garoto, cheio de esperança e vida, que alegria!
Na hora de ir embora, dei um forte abraço na criatura mais renovada de todo esse planeta, e segui o meu caminho. A cada passo para longe, toda a minha animação se esvai. Esqueci-me de perguntar o seu nome, corro, uso do resto das minhas energias e corro para encontrá-lo. Grito com uma voz tenra, infantilizada.
– Diga-me quem tu és?
– Meu nome é Ano Novo.
– Prazer, sou o Ano Velho.
E no fundo, fogos de artifícios, renovamos as esperanças, e guardamos o passado, nas caixinhas das lembranças.