Meu lugar dos sonhos – a unificação

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Hoje eu tive um sonho estranho e amedrontador. Acordei de repente com as imagens que me vieram durante o sono, em que o medo estava instalado, e fui direto contar para minha mãe de manhã cedo o que havia acontecido.

Contei a ela sobre o sonho enquanto tomava meu café quentinho vindo diretamente do fogão a lenha. Ela, curiosa, escutou cada detalhe da história que havia se passado comigo, sobre o mundo que eu havia visto, onde liberdade não era apenas uma palavra.

– Mãe, lembro-me que no sonho eu apenas observava e digeria tudo o que estava acontecendo, acredito que, em alguma parte da noite, tentei falar algo para as pessoas do sonho, mas no final acabei me calando por achar que minha opinião não valia a pena ser escutada. Na primeira parte do sonho, eu estava na escola sentado ao lado dos meus colegas, vendo-os conversarem sobre seus dias e sobre seus futuros. Alguns deles não tinham muitas condições de vida, outros eram filhos de donos de mercearia famosas em seu bairro, e eu, de alguma forma, sabia que todas as informações que eles passavam uns para os outros eram baseadas em mentiras, em fingir mostrar uma realidade que, na verdade, eles por dentro e por fora, não estavam vivendo. O quadro da sala estava dividido ao meio, de um lado, desenhos de flores e do outro, palavras de ódio escritas. Em algum momento, escutei a professora balbuciando algo sobre igualdade mas me pareceram palavras tão vazias que eu tive certeza de que ela não sabia do que estava falando, estava apenas repetindo frases prontas que ela já conhecia há anos. Na verdade, estávamos sendo ensinados a odiar e, como todos estavam acostumados a mentir, não sabíamos outra coisa além do que nos estava sendo ensinado. – Neste momento, minha mãe levantou e começou a arrumar a casa, mesmo de costas para mim, era evidente que ela, além de estar me escutando, também se perdia nos seus pensamentos, enquanto eu lhe contava minha história.

– Quando o sinal da escola soou, o cenário do meu sonho mudou, agora eu estava na nossa casa junto com a senhora e estávamos sentados no chão conversando sobre o que deveríamos comer ao meio-dia. No sonho, não tínhamos dinheiro, não tínhamos comida, mas tínhamos orgulho e estávamos com fome. Morávamos ao lado de uma mansão onde vivia um político muito conhecido e escutávamos os gritos das pessoas agradecendo a ele todas as coisas que ele havia proporcionado a elas, para todos os méritos dele. Fomos dar uma olhada e cestas de comida eram deixadas na frente da mansão dele, eu olhei pra senhora, dei um sorriso e voltamos a pensar sobre o que iríamos comer ao meio-dia. – Minha mãe que já estava terminando de limpar a sala olhou pra mim e deu um leve sorriso, confirmando que ela estava achando a história bem digna de um sonho.

Eu me levantei e fui arrumar minha cama enquanto gritava para ela o desfecho do meu sonho. Sei que ela estava prestando muita atenção, pois, a cada três segundos, parava na frente do meu quarto para escutar, como se tivesse esquecido a tarefa que estava fazendo.

– De repente, na nossa frente, sob o piso de madeira da nossa casa, estavam duas caixas brancas seladas com uma fita vermelha. Em cada uma delas, tinha uma etiqueta com apenas uma frase: “Qual será o preço?”. Eu sabia que tinha que abrir uma delas, e que se não abrisse agora eu teria que abrir no futuro. No fundo do meu coração uma ansiedade foi se espalhando, o que as etiquetas significavam? Por que eu tinha que abrir apenas uma? Por que as caixas estavam lá se eu estava seguindo minha vida tão bem? Por que ninguém abria as caixas pra mim? E foi quando eu coloquei minha mão no laço vermelho que eu havia escolhido naquele instante de tensão que eu acordei assustado.

Nesse momento minha mãe riu de mim, pois sabia que esse sonho era bem coisa que eu costumava imaginar. Típico de mim sonhar com essas utopias malucas. Enquanto eu procurava na minha bolsa o dinheiro para pegar o trem, minha mãe agora me esperava na porta, com seu melhor rosto de “tenha um ótimo dia, filho”.

Quando cheguei à estação lembrei-me de avisar minha mãe que hoje eu voltaria pra casa mais cedo. Peguei meu celular e liguei pra ela, porém acho que acabei ligando duas ou três vezes, pois ela não estava atendendo. Lembro-me que quando saí de casa, ela estava perdida em seus pensamentos como se estivesse remoendo memórias guardadas; então, imaginei que ela estaria concentrada demais para perceber o celular.

O caminho para a escola era longo, apesar de que nem sentia o tempo passar quando conversava com meu amigo no trem, e naquele dia eu tinha uma grande história pra contar pra ele. Esse amigo falava diferente, por que ele vinha de uma outra região do país, uma mais ao Sul, exatamente a região em que minha escola estava localizada. Dizem que há algumas gerações atrás, não era permitido cruzar a fronteira que cruzamos na viagem de trem todos os dias, algo sobre o país ser dividido entre Norte e Sul. Se estou bem informado esta divisão foi desfeita em um acordo entre os líderes de cada lado naquela época, pelo menos foi isso que minha mãe me ensinou, e ela sabe bastante sobre esse assunto.

Junto com o meu amigo do trem, cheguei na escola pronto para aprender. O assunto da aula daquele dia era união, sobre como somos um só no final das contas. A professora nos contou tudo sobre o que é a verdade, sobre como é importante as vidas ao nosso lado, nos contou que nada dura pra sempre e que é isso que nos faz ter esperança. Foi ali, naquele momento, naquele lugar, naquele espaço de tempo que eu estava vivendo que eu, finalmente, percebi que eu estava em casa, que era a esse sonho que eu pertencia e gostaria de viver minha vida.

Andriele Joras dos Santos Estudante do Curso Técnico de Química Fundação Liberato

Andriele Joras dos Santos
Estudante do Curso Técnico de Química
Fundação Liberato

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