Readequando as aulas de Educação Física no cenário de pandemia

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Marlon Luís Lucchini – professor de Educação Física da Fundação Liberato

A pandemia trouxe uma necessidade vital de adaptação. O distanciamento social passou a ser a orientação mais adequada para evitar a transmissão da covid-19, e a quarentena trouxe consequências negativas que impactaram no aumento do sedentarismo. Os equipamentos digitais e a estada prolongada em casa são alguns dos fatores que influenciaram na diminuição da prática de atividade física. Para driblar essas questões, precisei readequar as aulas de Educação Física, encontrando novas formas de atuar durante a pandemia.

Durante longos meses, as aulas presenciais foram suspensas, e tanto os estudantes quanto os professores precisaram se adaptar. Se, por um lado, foi preciso superar barreiras, por outro, descobrimos novas formas de interagir e aproveitar o melhor da tecnologia. O desafio foi enorme. No início, não sabia o que fazer com as aulas de Educação Física por meio das telas, sem interação, sem contato, sem transpiração ou sem as práticas esportivas. E assim continuei, ainda sem entender como seriam as atividades. Várias perguntas surgiam: como planejar, avaliar, orientar e aplicar os conteúdos?

Outros objetivos, assim, foram sendo incorporados, além dos que já tinha planejado. Meu objetivo principal sempre foi o cuidado com a saúde. Aprendi novas plataformas digitais, local diferente das quadras e dos espaços esportivos ao ar livre. A prática da atividade física seria dentro de casa, e as ferramentas tecnológicas seriam o ambiente de trabalho.

Enquanto profissional de Educação Física, entendo que a saúde do organismo depende da interação de diversos hábitos saudáveis. Dessa forma, procurei despertar outros cuidados com a saúde, além da prática de atividade física, como, por exemplo, a importância da hidratação, do relaxamento, do sono, da alimentação saudável, do lazer ativo etc.

Assim, estimular a realização de atividades físicas dentro de casa tornou-se uma proposta importante e viável. Com as ferramentas digitais, os conhecimentos e as habilidades a serem desenvolvidas chegaram aos estudantes por meio de desafios que poderiam ser entregues em formato de vídeos, imagens fotográficas ou relatórios.

Com o intuito de conquistar e atrair o estudante adolescente, precisei revisar minhas estratégias e possibilitar o aprendizado de novos conhecimentos para manter o processo da evolução motora, o condicionamento físico e a aquisição de habilidades técnicas desportivas. Propus, então, gincanas, ginásticas, danças, lutas, jogos e brincadeiras como estratégia de aprendizado para manter as turmas em movimento.

Posso confirmar que os estudantes realizaram as atividades, em uma grande maioria, pois recebi depoimentos, fotos, vídeos, mensagens e tarefas individuais das práticas das aulas de relaxamento, yoga, circuitos funcionais, atividades recreativas, musculação e Pilates. Com isso, comprovo a hipótese da importância que o papel da cultura do movimento humano traz como benefício para a nossa saúde, desde que isso seja realizado de forma organizada e planejada e que as demandas do nosso corpo, como transpirar e movimentar, sejam contempladas. Foi necessário esclarecer os conceitos de “corpo perfeito” e o que é ter um estilo de vida saudável, através da alimentação e repouso equilibrado, somados a uma rotina de exercícios para a melhoria da qualidade de vida.

Além da distância e da falta de acesso de alguns estudantes ao ambiente virtual, minha principal dificuldade foi a falta de materiais específicos da área em casa, como, por exemplo, bolas. Assim, a estratégia utilizada foi adaptar materiais alternativos, muitas vezes recicláveis, para incluir todos nas atividades. Usando baldes, calçados, almofadas, caixas de papelão, balões e sacolinhas de mercado, os fundamentos técnicos esportivos do handebol, futsal, basquetebol e voleibol foram desenvolvidos.  Com cabos de vassouras, garrafas PET, cordas e toalhas, as valências físicas de força, resistência, flexibilidade e agilidade foram trabalhadas. Potinhos, tampinhas, elásticos, jornais e copos plásticos foram utilizados em atividades lúdicas, jogos cooperativos e brincadeiras.

Se não tivemos as tradicionais atividades práticas presenciais, em que inúmeros benefícios são adquiridos, principalmente os de relações interpessoais nos jogos, agregamos outros conhecimentos, como, por exemplo, os de educação ambiental ao reutilizar materiais recicláveis. Cito alguns desafios propostos:

– Na aula de tênis de mesa, os estudantes tiveram a possibilidade de confeccionar a sua própria raquete com papelão.

– Nos jogos de campo e taco, a possibilidade foi a utilização de cabos de vassoura e bolinhas amassadas de jornal.

– Nos jogos cooperativos, a orientação foi a utilização de tampinhas, copos descartáveis, barbantes, garrafas e elásticos.

Por fim, através das garrafas PET, abordei o tema da reutilização inteligente de materiais recicláveis, trazendo a problemática desse resíduo no meio ambiente quando não descartado adequadamente. Dessa forma, utilizamos o material como cones nas práticas dos fundamentos técnicos esportivos, como halteres nas aulas de musculação e até mesmo como uma rapet, nome criado para este equipamento confeccionado semelhante a uma raquete, no jogo denominado de petbol.

A partir dessa experiência, posso afirmar que a Educação Física acompanhou as demais atividades da escola. Contudo, muitas dificuldades foram evidenciadas: a não aderência de todos no cumprimento das tarefas e principalmente a falta de interação entre os estudantes, de materiais esportivos e de espaços adequados em casa para as práticas. Apesar disso, optei por enfrentar as situações adversas por meio da reorganização do planejamento, da valorização da área como componente curricular importante nesse momento e da ênfase no cuidado com a saúde física e mental.

É preciso compreender que vivemos outro tempo. Foi um período emergencial, de pandemia. Não houve uma transformação da escola, nem reinvenção da Educação Física. Foram vividas outras práticas. E, nessa medida, a metodologia foi outra, sendo um processo de ensino planejado e executado distinto do precedente. Para além do bem e do mal e de julgar como certo ou errado, compreende-se que estamos envolvidos em um processo distinto, mas que abre uma oportunidade de avaliar o que tínhamos para planejar e como queremos a Educação Física do futuro.

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