ÉTICA E CIÊNCIA

1ª COMPETIÇÃO DE REDAÇÃO DO CLUBE DE CIÊNCIAS DA FUNDAÇÃO LIBERATO

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É com muito orgulho que apresento as reflexões sobre a relação entre ética e ciência expressas nos textos do estudante Rafael Vinícius Volkmer da Silva, do Curso Técnico de Eletrônica, e das estudantes Rhana Schmitz de Matos e Gabriela Leite Souza, do Curso Técnico de Química. Eles foram vencedores da 1ª Competição de Redação promovida pelo Clube de Ciências da Fundação Liberato.

Vemos que o tema proposto é de extrema relevância para abrirmos uma discussão sobre esse assunto, visto que precisamos ter bastante clareza para apoiarmos ou não as decisões que venham a ser tomadas por governos, universidades, institutos ou empresas quanto ao tipo de pesquisa que pretendem fomentar. É alentador vermos jovens abordarem de maneira madura, clara e objetiva temas complexos que, nos dias de hoje, mais do que nunca, precisam ser discutidos com profundidade para evitarmos que tomadas de decisão na área científica venham a colocar em risco não só nossa espécie, mas toda a vida no planeta.

O texto do Rafael, “O risco mortal das falsas verdades”, publicado nestas páginas, ganhou o primeiro lugar. Na redação, vemos que os cientistas precisam estar preocupados com a precisão de seus dados para que possam estar o mais próximo da realidade possível, evitando, assim, atitudes antiéticas, como a manipulação de dados, seja para sua projeção pessoal ou de seus interesses econômicos. Já os textos “Bebês dinossauros”, da Rhana, e “Ética e Ciência”, da Gabriela, obtiveram respectivamente 2º e 3º lugar.

“Bebês dinossauros” mostra que a ciência deve beneficiar tanto a humanidade quanto o planeta, e, para que não nos desviemos deste objetivo, é fundamental a ciência e a ética estarem juntas para qualquer decisão que venhamos a tomar. Já em “Ética e Ciência”, fica claro o quanto é fundamental termos a consciência da importância da ética para pesquisas científicas. As pesquisas estão direcionadas à solução de problemas da sociedade, o que justifica estarem sob leis e normas estipuladas pela ética. Provavelmente, em função do constante e rápido avanço da ciência, teremos cada vez mais situações controversas que irão demandar o aprofundamento das discussões sobre a relação entre ética e ciência.

Gostaria de terminar agradecendo o apoio da Direção da Fundação Liberato e parabenizando a equipe gestora do Clube de Ciências, composta pela estudante Rafaela Julien Nienow e pelos estudantes Rafael Ribeiro da Rocha Correa e Thevis Zidane Martins Thomaz, responsáveis pela idealização e organização dessa competição. Parabenizo ainda os autores e as autoras das brilhantes reflexões apresentadas em seus textos sobre esse importante tema.

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Amaury Silva Júnior
Professor de Biologia
Fundação Liberato

 


 

O RISCO MORTAL DAS FALSAS VERDADES

Rafael Vinícius Volkmer da Silva

O método científico busca, através de pesquisas e formulações de hipóteses, comprovar um questionamento e, a partir disso, desenvolver algo que auxilie a sociedade. A ética, nessa área, caso seguida corretamente, garante uma boa conduta de pesquisa, prezanado sempre pela comprovação dos fatos antes da divulgação. O problema é quando esses limites são extrapolados, e teorias não comprovadas são propagadas como verdades por pesquisadores imprudentes, colocando, muitas vezes, a vida de várias pessoas em risco.

O cirurgião Paolo Macchiarini, graduado na Universidade de Pisa, na Itália, mesmo com um brilhante legado em contribuições de pesquisas no ramo da medicina, foi responsável por um dos maiores escândalos envolvendo displicência médica já documentados. Sua tese, a princípio, baseava-se em uma forma de revolucionar o transplante de órgãos, utilizando estruturas de células tronco para transplantar traqueias. Isso, por si só, já era uma hipótese bem arriscada, que mexia com uma área ainda não explorada o suficiente para a realização de algo de grande risco, como Macchiarini queria, mas, mesmo sabendo disso, o médico deu seguimento à sua pesquisa.

Na hora da comprovação de todas as suas hipóteses, ao fazer testes em humanos, foi confirmado que Macchiarini manipulou e omitiu dados de suma importância para o andamento do tratamento em seus artigos, para que parecesse algo mais aplicável e sem tantos riscos. Graças a isso, seu projeto foi aprovado pelo comitê de ética e disponibilizado para a população. Pouco tempo depois, foi visto que o tratamento revolucionário de Macchiarini era, na verdade, algo sem as estatísticas necessárias para torná-lo seguro a um grande número de pessoas. Seus casos de sucessos eram isolados, o que resultou na morte de sete entre nove pacientes que fizeram o procedimento. Como consequência, o médico foi perseguido pela justiça e seu nome foi sujo para sempre, sem muitas expectativas para seus projetos futuros.

Tendo como exemplo a atitude negligente de Paolo, é correto afirmar que, caso as regras de ética não sejam seguidas apropriadamente em uma pesquisa cientifica, o pesquisador não colocará apenas sua reputação em risco, mas, também, dependendo do cunho de sua tese, a vida de outras pessoas. Uma pesquisa autorizada e comprovada é dada como verdade pela sociedade. Isso faz com que, seja lá o que for feito a partir dela, seja algo tanto autorizado por lei, quanto algo cuja eficácia seja comprovada, o que passa segurança para quem vier a usufruir de seus resultados, e essa segurança deve ser real. Portanto, a ética nas pesquisas científicas se torna algo indispensável, em qualquer área que seja, para evitar a propagação de falsas verdades e erradicar ou mitigar suas consequências na sociedade.

 


 

BEBÊS DINOSSAUROS

Rhana Schmitz de Matos

No aclamado filme “Jurassic Park” (1993), dinossauros habitam um parque temático que recebe o mesmo nome da obra e são criados a partir da clonagem do DNA retirado de insetos preservados em âmbar pré-histórico. Porém existe uma linha tênue que estabelece um limite entre o que é racional e, de fato, um grande avanço tecnológico neste feito, e o que é apenas uma grande ingenuidade por parte das pessoas que acreditam não existir consequências ao utilizar imprudentemente tal tecnologia. Nota-se, no filme, que a falta de ética por parte de alguns dos cientistas responsáveis pela pesquisa acarretou diversos problemas graves às pessoas envolvidas e gerou discussões, debatidas até os dias atuais, a respeito deste tema.

O avanço científico, que se acentua cada vez mais, todos os dias, permitiu que a engenharia genética se desenvolvesse a ponto de possibilitar até a modificação genética de humanos, mais precisamente de embriões, ainda que, até então, ninguém tenha chegado a atravessar esse limite subentendido. 

Sob esse viés, o objetivo principal desta edição dos genes, na teoria, é de reparar mutações gênicas e deter doenças debilitadoras antes que elas passem para gerações futuras. Contudo, refletindo sobre o processo, é perceptível a noção de que não se trata somente de casos isolados, mas de toda a população e evolução humana. Por isso essa prática é condenada por muitos e, uma vez normalizada, será cada vez mais comum a comercialização da ideia: “monte seu bebê em laboratório”, onde pessoas poderão simplesmente estimar e aumentar as chances para que seu filho nasça com determinada altura, certa cor dos olhos, entre outras características. 

Além disso, pode-se perceber que a busca pela fama e pelo prestígio científico, somada à falta de ética profissional, resultam em pesquisas, e, consequentemente, em experimentos que podem comprometer a segurança de todos. Dessa forma, a ética nas pesquisas científicas se faz essencial para que os progressos da ciência sejam realmente seguros para a sociedade como um todo e não apenas um capricho, ou um risco desnecessário, para os que podem pagar.

Em virtude deste fato, existem os chamados comitês de ética, responsáveis por garantir o respeito e a prevenção de dados em pesquisas voltadas para animais e humanos, cruciais na condenação do cientista chinês acusado de modificar geneticamente embriões de gêmeas, em 2018, assim como sua existência também teria evitado a maioria dos desastres ocorridos em Jurassic Park, impedindo que uma tecnologia tão revolucionária recebesse o tratamento negligente que recebeu durante o filme.

Diante dos argumentos supracitados, para que um progresso científico crescente, que beneficie tanto a humanidade quanto o planeta, exista, a ciência e a ética devem andar sempre juntas, lado a lado, evitando que situações repudiadas no passado aconteçam novamente, pois nenhum avanço será realmente válido se os valores éticos não forem respeitados.

 


 

ÉTICA E CIÊNCIA

Gabriela Leite Souza

Como dito por Mahatma Gandhi, duas das coisas que destroem a humanidade são “Sabedoria sem caráter” e “Ciência sem humanidade”. Deste modo, é possível afirmar que a ética é de extrema importância nas pesquisas científicas, pois é ela que garante o bom uso dos conhecimentos que o cientista possui e aplica em seu trabalho. No entanto, com a grande quantidade de avanços tecnocientíficos com a qual nos deparamos atualmente, é cada vez mais comum escutarmos relatos sobre pesquisas feitas às escondidas acerca de pautas que não são consideradas éticas pela sociedade. Assim, torna-se imprescindível a discussão dessas temáticas, para que elas sejam de conhecimento geral e possam ser observadas sob diferentes perspectivas, garantindo pesquisas dignas de confiança.

É importante ressaltar que ética nas pesquisas científicas é aquele conjunto de normas e leis que definem como se pode pesquisar, o que é certo ou errado dentro de uma pesquisa e quais os parâmetros e/ou limites que devem ser levados em conta, especialmente na etapa experimental, seja ela realizada em seres vivos ou na natureza. Essas leis ou normas podem variar de país para país ou até mesmo entre estados de uma mesma nação. O uso da técnica de edição gênica CRISPR, por exemplo, é proibida em diversos países, como no Brasil, mas em outros não existe uma legislação clara acerca do assunto, existindo ainda a situação dos Estados Unidos, que é o único país que permite esse tipo de pesquisa, desde que não faça uso de verbas federais.

Deve-se também lembrar que a ciência é da sociedade e deve ser feita para ela. Assim, seus objetivos devem estar intrinsecamente ligados a avanços ou melhorias de questões que vêm causando problemas e que não podem ser meramente respondidas pelo senso comum. Por isso a ciência deve ser financiada por verbas federais e estimulada por programas governamentais, evitando que ela seja custeada por pessoas que buscam promover seus próprios interesses, ignorando as questões éticas previamente mencionadas. 

Usando novamente como exemplo a técnica CRISPR, pode-se afirmar que desenvolvê-la foi de grande progresso, especialmente quando se fala em saúde, já que com ela é possível pensar em uma série de realizações e planos para as novas gerações, mudando nossas perspectivas de vida para um futuro não tão distante. Por outro lado, o uso desse método também traz diversos questionamentos que rompem com a pauta científica e adentram o campo da ética e das questões socioeconômicas, pois ela tanto pode ser usada para a cura de doenças genéticas, quanto para melhoramentos feitos antes mesmo do nascimento, lembrando o cenário retratado no livro “Admirável Mundo Novo”.

Outra questão levantada nesse tema diz respeito à forma como encaramos pessoas diferentes de nós devido a questões genéticas. Muitos indivíduos com nanismo, por exemplo, não consideram que esse deva ser um fator alterado em seu genoma, pois isso seria como considerá-los uma anormalidade, enquanto eles se sentem bem da maneira que são e não gostariam de modificar isso em si mesmos ou em seus filhos. Já outras pessoas acreditam que essa técnica poderia ser utilizada para fins estéticos, com o objetivo de realizar melhoramentos naqueles que estão dispostos a pagar, desviando do que deveria ser o principal objetivo dessa pesquisa: a saúde.

Portanto, é possível perceber que a ética é imprescindível nas pesquisas científicas, já que elas são direcionadas aos problemas e objetivos da sociedade e não podem fugir das leis e normas estipuladas por ela. Além disso, a ética torna as pesquisas dignas de confiança e faz com que barreiras como a da edição do genoma humano antes do nascimento para aprimoramento não sejam ultrapassadas sem o consenso da sociedade como um todo, não ferindo direitos ou normas.

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