Inquisição e a caça às químicas

iquisicao-grande

Inquisição e a Caça às Químicas¹

Se um dia eu pudesse ver
Meu passado inteiro
E fizesse parar de chover
Nos primeiros erros…
(Capital Inicial)

A última bruxa de Salém foi absolvida no final de julho de 2022. Sim, não é uma brincadeira. Ela foi inocentada de crimes de bruxaria 329 anos depois. Não nos cabe aqui explicar o caso específico. Apenas questionar: por quanto tempo mais vamos suportar sermos condenadas por bruxaria? 

Toda vez que ouvimos a palavra bruxa, ela aciona a memória da exclusão, do sofrimento e da dor. Poucos sabem que essa exclusão, no passado, interessava a um grupo masculino que usava essas bruxas quando necessário e as matava quando queriam. Em nome de Deus,  tornavam-nas bruxas e, em nome de Deus,  matavam-nas.

Quem eram as bruxas e por que eram condenadas ao ostracismo, à tortura e à morte? O que faziam que causava interesse e medo? Esse foi o objeto da palestra que fizemos – professoras Paola (química) e Sonia (história) – na semana da Química de 2022, num auditório lotado e atento. 

Invejosas? Feias e narigudas? Vilãs? Esse retrato estereotipado passa por obras de Shakespeare até os filmes mais atuais, com um ponto em comum: mulheres. Não necessariamente apenas mulheres eram acusadas de bruxaria, mas é certo dizer que eram maioria. Detentoras de posses que poderiam ser tomadas pela igreja, vendedoras de cerveja que poderiam ser tiradas da concorrência por homens, até qualquer motivo torpe – a cor do cabelo, sinais de nascença, rivalidades – a conveniência de acusá-las de um pacto com Satã era grande. 

Outras eram conhecedoras da natureza, de ervas e de chás que chamamos de elixires e poções e muito ajudaram a população local a tratar de moléstias, atrair um parceiro ou machucar um inimigo. Ah, algumas tinham o poder de voar! Ao menos em sua mente…

A magia e o mistério eram, afinal, pura química. Flores, sementes, frutos, cogumelos e até pele de sapo eram os ingredientes utilizados, podendo causar desde alucinações de voo, euforia, passando pelo bem-estar de um amor repentino, pela letargia de um sono profundo ou até mesmo pela temida morte.  

Esses conhecimentos traziam um status de poder que também era interessante controlar. A desigualdade de gênero e as relações de poder não surgiram na Inquisição, mas foram reforçadas e levadas adiante na história.

Assim como no passado, a desigualdade de oportunidades era evidente. No presente, o mesmo acontece. Seja nas listas masculinas do prêmio Nobel (veja o caso da Marie Curie), seja na imposição de comportamentos primitivos às mulheres e meninas obrigadas a se casarem com 8 anos ou até mesmo na proibição de frequentar a escola como no Afeganistão. O que não sabem é que estamos pesquisando em busca de um elixir contra a ignorância. Enquanto isso, seguimos lutando por um mundo mais justo, igualitário e sem preconceitos.

¹ Adaptação de uma palestra estilo “TED Talk” apresentada na Semana da Química de 2022 na Fundação Liberato.

Paola Del Vecchio e Sonia Porto Machado Professoras da Fundação Liberato

Paola Del Vecchio e Sonia Porto Machado
Professoras da Fundação Liberato

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *