Havia tantas câmeras e pessoas que tudo o que a menina mais queria fazer era fugir, mesmo este sendo, supostamente, o momento pelo qual lutou a vida inteira. Os flashes cegavam-na momentaneamente, como se esquecessem que havia uma pessoa, uma menina, por trás da faceta que conheciam.
— Agora, com vocês, encerrando a noite das finalistas de hoje, a número 263! – anunciaram ao microfone, avisando a menina de que a sua hora havia chegado.
Tomando fôlego e ajustando os seus patins uma última vez, deu o seu primeiro passo na direção da pista de gelo. Os gritos e flashes triplicavam à medida que ela se aproximava do centro, mas não havia um sorriso em seu rosto, como havia no de seu treinador; o dela estava repleto de confusão.
No último ano, havia ganhado ouro na liga nacional pela primeira vez, colocando-se entre as dez primeiras do ranking mundial e conquistando uma vaga imediata para a Olimpíada de inverno. Era uma coisa boa, incrível e maravilhosa; ela havia começado a patinar aos três anos e saiu de casa aos oito, para que pudesse treinar com o melhor patinador do país.
Patinar era a sua vida; tudo o que ela fizera até agora, todos os sacrifícios, perdas e trabalho duro a levaram até aqui. Então, por que, ao se posicionar para o começo da principal performance de sua vida, tudo o que ela conseguia pensar era que queria acabar logo com isso? A menina deveria estar feliz, não devia?
O sinal foi acionado, e sua música começou a tocar. Seus pés deslizavam habilmente pelo gelo, saltando e equilibrando-se tão facilmente quanto alguém respira. A patinadora anterior era a sua principal rival da noite, com 224,5 pontos no total, liderando a disputa com a maior pontuação da competição até o momento. Ela tinha um nível de dificuldade alto; se executasse todos os movimentos com perfeição e somasse com o seu programa curto, cuja nota era mais do que razoável, a medalha de ouro seria dela.
As lâminas dos seus patins cortaram o gelo na aterrissagem do seu último salto, finalizando a performance. Sua respiração ainda se estabilizava quando saiu da pista, indo se encontrar com o seu treinador, que estava aguardando a nota com animação.
— Aquilo foi incrível! Seu axel, porém, deveria ter sido mais alto e um pouco mais rápido, mas somando com todo o resto da sua execução e o nível de dificuldade, sua pontuação, com certeza, vai te deixar na liderança!
Sua voz mesclou-se com as dos jornalistas, entrevistando-a em línguas que ela não entendia. Em vez de responder a qualquer um deles, seus pensamentos ainda se voltavam para a falta de felicidade ao entrar na pista.
A menina não tinha muitas certezas na vida, mas seu amor pela patinação era uma delas; não estaria aqui, se não fosse. Em que momento ela perdeu sua paixão e se deixou ser consumida pela ambição?
— E agora, com os pontos somados da última patinadora, número 263, temos o resultado da competição!
O narrador tirou-a dos seus pensamentos e levou-a para o presente novamente. O grande problema é que ela já sabia o resultado, sua série havia sido perfeita, não havia como…
— Senhoras e senhores, somando 219,7 pontos, a patinadora número 263 fica com a prata! Aplausos para a grande ganhadora, a patinadora número 262, o ouro é dela!