relato: ENSAIO FILOSÓFICO

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O sábio, porém, nem desdenha viver, nem teme deixar de viver; para ele, viver não é um fardo e não-viver não é um mal” EPICURO (CARTA A MENECEU)

Os alunos das 2ª séries da Fundação Liberato, neste ano, foram desafiados a construírem um Ensaio Filosófico. Essa proposta consiste na produção escrita de um texto argumentativo em que se defende uma posição sobre um determinado tema filosófico, com base numa pergunta, sendo necessário apresentar, no mínimo, dois argumentos, indicando, para cada um deles, possíveis objeções seguidas de suas refutações. Na preparação para essa atividade, houve um estudo sobre diferentes correntes filosóficas do período helênico, tais como: Epicurismo, Estoicismo, Pirronismo e Cinismo. O papel da filosofia dessa época era proporcionar alguma forma de paz de espírito e de felicidade interior às pessoas desorientadas e inseguras com a vida social. Nesse contexto, as preocupações coletivas cederam lugar aos de interesses pessoais; enfraqueceu-se a reflexão política, e a vida privada tornou-se a questão filosófica principal. As correntes filosóficas ficaram conhecidas como “artes de viver” ou “filosofias de vida”.

O Ensaio filosófico, que partiu da compreensão dessas diferentes correntes, foi elaborado pelos alunos divididos em pequenos grupos. A construção desse texto deveria seguir os seguintes critérios: escolher um problema do cotidiano e relacioná-lo a uma das correntes filosóficas estudadas, evidenciando, primeiramente, a tese do representante principal dessa corrente; apresentar, na sequência, ideias que estabelecessem concordância, discordância ou ponderação em relação ao assunto abordado. Após concluída essa etapa do trabalho, os alunos, em aula, apresentaram o material produzido à turma.

Para exemplificar essa experiência pedagógica, segue o Ensaio Filosófico dos alunos Arthur Prass da Silva, Davi Faistauer, Joseane Luana de Souza e Taís de Moraes Bueno, alunos da turma 3224, Curso Técnico de Mecânica.

 

ENSAIO FILOSÓFICO – Devemos nos preocupar com a morte?

1. Introdução

A questão da morte sempre foi um tópico muito discutido desde os tempos antigos, principalmente por filósofos. Inclusive um dos filósofos que discutiu e expressou sua opinião sobre o assunto foi Epicuro, cujo principal pensamento sobre esse tema pode ser exemplificado na seguinte frase de sua própria autoria: “A morte não é nada para nós, pois, quando existimos, não existe a morte, e quando existe a morte, não existimos mais”. Com essa afirmação, Epicuro trouxe a ideia de que não devemos nos preocupar com a morte e que o caminho para alcançar a felicidade plena seria buscar ter uma vida mortal saudável ao invés de buscar a imortalidade.

Como grupo, também concordamos com Epicuro no fato de que não devemos nos preocupar com a morte, pois, além de ser inevitável, não sabemos quando iremos morrer. Por isso, devemos viver uma vida feliz e sossegada.

Embora Epicuro tenha apresentado essas teses, nem todo mundo concorda com elas. Será que de fato não devemos nos preocupar com a morte?

2. Argumento 1: Não devemos nos preocupar com a morte, pois não tem influência direta sobre a vida.

Nosso corpo é composto por matéria, que, por sua vez, forma todas as células que compõem nosso organismo. Porém, essas células, de acordo com o tempo, acabam envelhecendo e deixando de funcionar, causando a morte do nosso organismo. Sendo assim, a única certeza que temos na vida é de que estamos vivos e de que, em algum dia, iremos morrer. A morte é um acontecimento natural, e não somos capazes de impedir que aconteça, então, qualquer preocupação perante ela é irrelevante, pois a morte não é algo presente na nossa vida, é apenas um acontecimento futuro que todos temos a certeza de que vai acontecer, ou seja, é algo que escapa do nosso controle. Contudo, por mais que não tenhamos controle sobre a morte, temos controle sobre a nossa vida, podendo, assim, fazer coisas boas com o tempo que ainda nos resta.

A. Objeção
A preocupação advinda da morte é algo instintivo, nós naturalmente fugimos dela, porém não especificamente sobre o ato da morte, e, sim, sobre o que a antecede, pois, a menos que seja de causas naturais, nossa intuição diz que a morte é antecedida por muita dor. Imagine uma pessoa com uma doença degenerativa. Essa pessoa tem um “prazo” de vida, mas isso não é apenas saber quando se vai padecer, mas, sim, ter um resto de vida muito sofrido, com várias limitações e empecilhos para tudo. Isto é, a preocupação seria mais com o modo como vamos morrer do que com a morte em si.

B. Contraobjeção
Sim, evitar a morte é algo instintivo, porém essa intuição pode ser controlada. Assim como temos esse instinto, também temos outros, como, por exemplo, a raiva. Mas, como sabemos, é preciso apenas um pouco de autodisciplina para que possamos controlá-la. Então, mesmo que tenhamos o instinto de nos manter vivos, podemos controlar isso e passar a viver uma vida sem nos preocuparmos com a morte. Após termos isso controlado, não é o modo como estamos morrendo, mas, sim, toda a vida que estamos deixando para trás, todos os momentos e todas as pessoas que amamos e nos amam que faz com que temamos a morte. Por isso, é importante aproveitar a vida com plenitude, para podermos morrer com a certeza de que o melhor foi feito.

3. Argumento 2: Morte é apenas a ausência de sentidos.

Os seres humanos possuem cinco sentidos biológicos básicos: visão, olfato, paladar, audição e tato. Através deles, sentimos as coisas, e tudo é interpretado pelo nosso cérebro, é assim que nós nos relacionamos com o mundo ao nosso redor. Um objeto qualquer, como, por exemplo, uma pedra, não tem essa percepção de mundo; logo, ela não tem consciência das coisas à sua volta. Porém, todos nós, seres humanos, percebemos as coisas, pensamos e sentimos, ou seja, temos sensações, e é isso que nos define. Por esse raciocínio, o que nós chamamos de morte é apenas a privação de todos esses sentidos. Não devemos nos preocupar com algo tão efêmero.

A. Objeção
Dizer que o homem é simplesmente sensações é retirar toda a importância de sua existência. Qual o sentido de estar vivo, se formos apenas isso? Tem algo maior que nós, que nos faz ser quem somos: nossa alma. Sem ela, não há sentido em viver, pois nossa vida seria insignificante. Nós, com certeza, somos mais que matéria e sensações. A morte não é o fim, pois, quando morremos, se nossa alma estiver purificada, iremos para um lugar melhor. Então, devemos nos preocupar com a morte, pois ela é apenas o fim da nossa vida na Terra, existindo ainda um plano espiritual.

B. Contraobjeção
Não há evidências de que existe vida após a morte e qualquer crença baseada em metafísica ou religião é cientificamente infundada. Não há certezas ou evidências da existência de um plano espiritual depois que morremos, ninguém voltou para contar seu relato após sua morte; então, acreditar nisso é apenas uma forma de consolo para conseguirmos lidar com a morte das pessoas. Quando algum parente seu morre, é muito mais reconfortante pensar que ele foi para um lugar melhor do que pensar que ele virou apenas um amontoado de matéria orgânica. As pessoas só acreditam nisso, porque faz bem para elas, não porque realmente seja verdade. Até aí, essa forma de pensamento não causa nenhum mal, porém limitar toda sua vida pensando somente em ir para um lugar melhor não é algo inteligente a se fazer. E se não houver esse tal “lugar melhor” e a única coisa que temos for a vida na Terra? Você terá desperdiçado sua vida toda, deixando de fazer as coisas que tem vontade em prol de algo fictício. Ou seja, o melhor a fazer é se preocupar mais com sua vida do que com sua morte, pois a única certeza é de que temos uma vida a aproveitar; a morte é só um detalhe.

4. Conclusão

Nós concordamos com Epicuro em suas teses, principalmente, no ponto em que devemos aproveitar nossa vida com plenitude. Em suma, não devemos nos preocupar em morrer, pois a morte é algo natural, não há como evitar que aconteça, ou seja, essa preocupação acaba somente por limitar a nossa vida e não nos traz nenhum benefício. Deixar de se preocupar com a morte, na verdade, é tirar um peso de suas costas. Nossa vida passa a ser melhor sem esse sofrimento.

Leandro Andrighetti Professor de Filosofia Fundação Liberato

Leandro Andrighetti
Professor de Filosofia
Fundação Liberato

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