“Antártica: Continente dos extremos“ o mais frio, mais seco, mais alto, mais ventoso, mais remoto, mais inóspito e o mais preservado de todos os continentes. Principal regulador térmico do planeta, influencia com intensidade o clima na América do Sul. É também a região mais sensível do planeta às mudanças ambientais.
Tive a oportunidade de realizar minhas atividades de campo e pesquisa por duas vezes nesse continente incrível: de fevereiro a março de 2010 e novembro de 2010 a janeiro de 2011. Através da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), vinculada ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Antártico Pesquisas Ambientais (INCT-APA), realizo minhas pesquisas de doutorado com o pinguim-antártico (Pygoscelis antarctica). A previsão de defesa da minha tese de doutorado é em julho de 2013, quando terei informações novas a respeito dessa espécie.
O pinguim-antártico é uma ave endêmica desse continente gelado e encontrado principalmente na Península Antártica e ilhas próximas. Sua fonte alimentar básica é o crustáceo chamado krill-antártico (Euphasia superba). Possui em torno de 70 centímetros de altura e pode chegar a 4,5 quilogramas quando adulto. Sua época de reprodução é na estação do verão, entre outubro, quando retornam para suas colônias de reprodução e março, quando adultos e jovens migram para as águas marinhas próximas ao Círculo Polar Antártico onde permanecem até a próxima estação reprodutiva.
Nos últimos 50 anos, o tamanho populacional dessa espécie tem passado por flutuações. No início das observações, a espécie aumentou em abundância e, no final da década de 80, começou a diminuir substancialmente. Um dos meus objetivos é compreender essa dinâmica populacional relacionada a fatores ambientais como as mudanças climáticas e, para isso, é necessário ir à Antártica para coletar os dados ecológicos e biológicos. É na época da estação reprodutiva que vamos ao continente fazer a coleta desses dados.
Durante a primeira expedição da qual participei, XXVIII Operação Antártica Brasileira, permaneci durante trás semanas no acampamento e refúgio brasileiro Emílio Goeldi, na Ilha Elefante (Arquipélago Shetlands do Sul). Contamos com o apoio da Força Aérea Brasileira, através do avião Hércules para chegar até a Antártica (o aeroporto fica na Ilha Rei George), onde o Navio de Apoio Oceanográfico Ary Rongel da Marinha Brasileira nos aguardava para o embarque. Chegando à Ilha Elefante, a descida dos pesquisadores e material de acampamento foi realizada por meio de um helicóptero. Os meios de comunicação utilizados nesse acampamento foram rádio VHF e Iridium (telefone via satélite). Ficamos praticamente isolados do mundo, longe da família, dos amigos e do conforto a que estamos habituados em nosso dia a dia. A comida é altamente calórica, composta por muitos carboidratos e gorduras para nosso suprimento energético. Não há aquecimento no interior do refúgio, então, sempre permanecemos bem agasalhados, pois as temperaturas variavam entre 7 graus negativos até 2 graus positivos, mas a sensação térmica chegava a 22 graus negativos em dias de vento gelado mais intenso. Diversas vezes tivemos que derreter neve para que tivéssemos água líquida para uso doméstico e para higiene pessoal. Sendo assim, banho é artigo de luxo, de forma que buscamos outras formas alternativas para higiene pessoal. Um elemento fundamental para a sobrevivência de um local como esse é o trabalho em equipe, que deve ser de forma madura e ética para alcançar os objetivos das pesquisas e para o próprio bem-estar pessoal.
Na expedição seguinte, XXIX Operação Antártica Brasileira, permaneci durante quase dois meses (novembro de 2010 a janeiro de 2011) na Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF), pertencente ao Brasil. Esta, localizada na Baía do Almirantado, na Ilha Rei George, foi inaugurada em 6 de fevereiro de 1984 e incendiou em 25 de fevereiro de 2012. A experiência profissional e pessoal por lá foi extraordinária. Muita convivência e troca de experiências com pesquisadores brasileiros e estrangeiros e também com a Marinha Brasileira, sempre de prontidão no auxílio às atividades de campo. Cria-se um lar antártico, pois durante o período de permanência são aquelas as pessoas do seu cotidiano, de forma que a convivência e trabalho em equipe são mais uma vez, fundamentais. Na EACF, havia maior conforto, desde aquecimento interno, chuveiros, academia de ginástica e comunicação com diversos lugares do mundo via internet. Tinha a capacidade para acomodar com tranquilidade em torno de 55 pessoas, entre pesquisadores e militares. Todos participavam ativamente de atividades diárias de refeições, organização e limpeza do ambiente, através de uma escala de servidão.
Tanto no acampamento como na EACF, o bom humor e a perseverança sempre foram características essenciais para superar a distância da família e as dificuldades pessoais, bem como as atividades em campo sob um frio intenso e necessidade de muito esforço físico para as coletas de informações. Concluo, afirmando que a aprendizagem tanto na esfera profissional como pessoal é bastante intensa, levando-me ao entusiasmo de partilhar os conhecimentos adquiridos com outras pessoas do meu convívio diário ou não, de forma com que sintam um pouquinho da força positiva da vida desse lugar tão especial!