Abandono, reprovação e Ensino Médio Politécnico

Qualquer pessoa que tenha uma mínima capacidade de observação, percebe a precariedade das escolas públicas estaduais. Quantas escolas estaduais têm um ginásio coberto para as práticas esportivas? Quantas têm laboratórios de informática? Quando tem o laboratório, falta o técnico responsável pela sua manutenção. Quantas têm bibliotecas atualizadas e com funcionários responsáveis, funcionando em todos os turnos? Quantas têm salas de aulas climatizadas, com quadros brancos e tomadas para computadores e projetores? Quantas estão em locais de difícil acesso, onde o poder público não oferece um transporte coletivo eficiente e de qualidade?

Paralelo a isso, temos um quadro decadente com professores desmotivados, fazendo de conta que ensinam e alunos fazendo de conta que estudam. Professores fazendo jus a um salário absurdamente aviltante. Qual o percentual de alunos que desejam fazer algum curso de licenciatura? Os alunos mais qualificados que emergem desse caos não querem ser professores, a não ser como uma atividade complementar. A sociedade como um todo também não valoriza o trabalho do professor. Alguns ainda pensam que não é trabalho, que é uma atividade lúdica, que não requer muito esforço e que tem três meses de férias. Quando leio que nós, professores, somos os responsáveis pelos altos índices de reprovação e abandono escolar, fico estarrecido. O professor que procura fazer seu trabalho apesar de tudo isso, que passa conteúdos fazendo avaliações e cobrando de seus alunos esses conteúdos. O professor que não faz como muitos médicos do SUS fazem, negligenciando atendimento à população que mais necessita. Esse professor, muitas vezes, ainda é responsabilizado por esses índices.

A proposta do atual Secretário de Educação do Estado, para o ensino médio nas escolas públicas estaduais está contrária à atual realidade econômica e social em que vivemos, porque veio praticamente pronta de cima para baixo, com pouca ou nenhuma possibilidade de alteração e também porque  está centrada nessa premissa de que o professor é o responsável pelo desinteresse do aluno. Não é a falta de infraestrutura nas escolas e nem a desvalorização dos professores e funcionários que causa todo esse descaso! Porque aumenta a carga horária de aulas, fazendo com que o aluno permaneça mais tempo na escola. O que seria em si a parte positiva da proposta, mesmo com toda essa precariedade. O problema é que a metade desse tempo é para a chamada “parte diversificada”, fazendo com que o aluno no terceiro ano do ensino médio tenha, por exemplo, um período de matemática por semana. O aluno tem que ter atividades culturais e práticas para a inserção no mercado de trabalho, mas essa parte poderia ser, no máximo, 25% dessa carga horária.

Os alunos estão com muitas dificuldades, principalmente, em Português e Matemática. Eles estão sendo cada vez mais empurrados para a série seguinte para não aumentar os índices de reprovação. A nossa realidade econômica está exigindo profissionais cada vez mais qualificados. Os nossos alunos precisam aprender a escrever corretamente, defendendo suas ideias com argumentos convincentes, aprender a equacionar e resolver problemas na Matemática e, assim, se interessar pelos cursos técnicos, pelos cursos de engenharia, ou mesmo pelas licenciaturas de Matemática, Filosofia, Química e Física, quando isso valer a pena. Enfim, nós precisamos de mais períodos de Português e Matemática. Antes de o aluno fazer alguma aplicação da Matemática ele precisa dominar as operações fundamentais e ter o “traquejo algébrico”. Isso só o professor de Matemática qualificado, motivado e com carga horária razoável poderá oferecer para o aluno.

Então, não precisa inventar a roda. Não precisa inventar um ensino “politécnico” com 50% de “diversos” em escolas sem laboratórios e salas de aula adequadas. Basta melhorar a infraestrutura, oferecer um melhor transporte coletivo e, principalmente, valorizar o trabalho do professor e dos funcionários de escolas que a melhora nos índices de abandono e reprovação escolar será automática.

José Celmar Roir da Silva Prof. de Matemática nas escolas: Fundação Liberato em Novo Hamburgo, Esc. Est. Polisinos e Esc. Est. Olindo Flores da Silva em São Leopoldo.

José Celmar Roir da Silva
Prof. de Matemática nas escolas: Fundação Liberato em Novo Hamburgo, Esc. Est. Polisinos e Esc. Est. Olindo Flores da Silva em São Leopoldo.

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